sexta-feira, 25 de março de 2011

A BOLA E O LIVRO

Por Galeno Amorim
O sonho de Edward era ser jogador de futebol. Começaria, por certo, no seu glorioso Mirassol Futebol Clube e, depois, quem sabe, poderia jogar num time grande. Ou mesmo virar ídolo do escrete nacional... Sonho, enfim, era o que não faltava.

E por falta de treino é que não lhe escaparia a chance. Todo santo dia ele e um bando de garotos sem eira nem beira praticavam com fervor quase religioso, rumo à glória praticamente certa.

Naquela metade de século 20, este era o sonho dele e de milhões de Edwards pelo ainda não País do futebol.

E, de certa forma, não deixa de ser verdade que foi graças ao futebol - ou, melhor, a uma partida de futebol - que a vida começou a dar uma guinada pra ele. Tudo começou naquele dia em que Edward, menino de não mais do que oito anos, participava de uma disputadíssima pelada no pátio da escola.

Até que em determinada altura da peleja um perna de pau qualquer dá um tremendo chutão. A bola vai parar lá longe. Escalado pra resgatar a preciosa, que se enfiara por uma maldita janela aberta, lá foi o jogador agora travestido de gandula.

E o que viu, do outro lado, chamou a atenção de Edward. E tanto que ele jamais voltou para terminar a partida.

Nunca aquele menino havia visto tanto livro junto. Aquilo, ele que não era bobo nem nada logo percebeu, era uma biblioteca. E, justo naquela hora, chegava à escola uma penca de livros novinhos em folha.

Edward pegou um deles por acaso - o título da obra era "A Banana que Comeu o Macaco", disso jamais ele se esqueceria pelo resto de sua vida. Em um ano, Edward leria nada menos do que 250 livros.

Aos poucos, também já escrevia melhor. Um dia, o professor mandou, sem que ele soubesse, um texto de sua autoria para participar de um concurso. E não é que o rapazote faturou o primeiro lugar?!

Edward passou a gostar cada vez mais dessa história de leitura. Abiscoitou um outro prêmio aqui, outro lá, e até passou a ganhar algum dinheiro com isso.

Um dia foi prestar concurso para o Banco do Brasil, disputado quase a tapa por jovens interessados numa carreira estável e respeitada. Só que, na hora da prova, ele tirou foi um belo dum zero em Contabilidade. Graças aos livros que se habituara a ler, conseguiu livrar a cara, com nota dez em todas as outras matérias.

De novo os livros mudariam o rumo de sua vida: um dia Edward corrigiu, sem qualquer pretensão, a professora do Cursinho. Sua argumentação era tão consistente que a escola não teve dúvidas: demitiu a professora e contratou o aluno no lugar dela.

Para dar conta das aulas de Latim na faculdade, o moço foi buscar ajuda em um sebo paulistano. Como o dinheiro era curto, fez vários resumos. Quando se deu conta, já tinha escrito seu próprio livro - o primeiro de uma longa série ainda por vir.

Edward e os livros pareciam mesmo fadados uns ao outro. E decidiu ir de vez atrás deles e abraçar a carreira de linguista. Acabou ficando famoso. Hoje em dia, não há faculdade de Letras no País que não estude ou não tenha como referência pelo menos uma obra de Semiótica e Linguística do professor Edward Lopes.

- A arte é eterna, mas a Ciência, não... - ele ensina.

A seleção brasileira de futebol pode ter perdido um talento incerto. Mas o País acabaria por ganhar um tarimbado craque das letras.

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